domingo, 26 de fevereiro de 2017

Martim Afonso de Sousa, O Edificador: Uma Viagem pelo Tempo ao Começo da Nação Paulista Partindo do Outro Lado do Atlântico

Se os hispânicos têm o almirante Cristóvão Colombo como o estruturador de sua terra, os Paulistas têm Martim Afonso de Sousa, o nobre português que foi o responsável pela estruturação do que viria a ser a capitania de São Vicente, ente que daria origem à Nação Paulista no futuro. Sua viagem ao nosso continente foi a primeira expedição colonizadora oficial na América Portuguesa.


Martim Afonso de Sousa retratado pelo mestre Benedito Calixto


Sousa era o filho mais velho de Brites de Albuquerque e Lopo de Sousa, Senhor do Prado e Alcaide-mor de Bragança. Natural de Vila Viçosa, pertencia a uma das mais nobres e antigas famílias de Portugal, os Sousas Chichorros. Descendia por linhagem bastarda do rei Afonso III, apelidado Bolonhês, quinto rei de Portugal, e apesar de toda a nobreza em seu sangue, tinha fama de ter sangue judeu por causa de sua avó paterna Maria Pinheiro, afamada de ser cristã nova. Tal fama jamais foi comprovada, porém. ¹ 

O nobre era tido com muito apreço tanto na corte portuguesa quanto na espanhola devido ao seu talento e entendimento.² Quando morando em Castela junto à sua esposa castelhana Ana Pimentel, chegou a servir o rei Carlos I de Espanha, também imperador romano-germânico Carlos V, na luta contra os franceses. Por consequência, foi convidado a permanecer na corte imperial, oportunidade que lhe faria crescer a bagagem e o poder, devido ao caráter plurinacional e multicultural do séquito de Carlos V, mas recusou a oferta, decidindo permanecer na corte de João III de Portugal, de quem era amigo desde a adolescência. ³ 

Esse homem é um dos principais nomes na Expansão Portuguesa. Como poucos indivíduos puderam fazer ao longo da História, Martim Afonso personificou o espírito conquistador e aventureiro de seu tempo e faz parte da gloriosa história do mais fascinante reino ibérico. Em dezembro de 1530, Martim Afonso viaja à América Portuguesa para realizar algumas tarefas de organização com a intenção de povoar efetivamente a terra para garantir a posse portuguesa frente à ameaça da França, país que não reconhecia os tratados de partilha do mundo firmados entre Portugal e Espanha e adotava o princípio de que era possuidor duma terra quem verdadeiramente a ocupasse.⁴ Dom João III então lhe dá autorização para estabelecer aqui tabeliães e oficiais de justiça ⁵ e conceder terras em regime vitalício àqueles membros da expedição dispostos a se estabelecerem no novo território.⁶ 

Além de começar o povoamento, Sousa tinha a missão de conhecer o litoral da nova terra de Vera Cruz de Norte a Sul, avaliar as condições climáticas, assim como o relevo, os rios, as reservas de água seguras, o potencial econômico da terra e a contratação de indígenas.⁷ Antes de adentrar a São Vicente, Martim Afonso encarregou alguns membros da expedição de penetrar o rio Ribeira numa das primeiras jornadas de reconhecimento do interior das novas terras. O resto seguiu para o Sul, e ao encontrarem a região platina, Pero Lopes, irmão mais novo de Martim, teve a missão de realizar uma empresa de reconhecimento no Rio da Prata, região ocupada por espanhóis. Enquanto isso, o nosso construtor seguiu para São Vicente a fim de realizar seu trabalho. É importante notar que ao chegar em terras Paulistas, Martim Afonso teve ajuda de náufragos europeus e cristãos novos que já habitavam essa região e tinham um contato com os povos locais², como o Bacharel de Cananeia e João Ramalho. Acredita-se também que firma-se em Martim Afonso de Sousa a tolerância em relação à procedência dos colonos, dado que era tido como «amigo dos cristãos novos». Com isso, pode ter facilitado a entrada no território Paulista de conversos fugidos do Reino¹, o que fez de São Paulo uma espécie de terra prometida para tais pessoas, como já falado noutro artigo (acesse aqui: http://migre.me/w0Z1l). Em 1532, nosso capitão-mor oficializou a Vila de São Vicente e a aprimorou em diversos aspectos. Também fundou alguns povoados auxiliado pelos portugueses que aqui viviam.


«Fundação de São Vicente», por Benedito Calixto


Ainda graças a Martim o plantio de cana-de-açúcar prosperou em São Vicente, pois sua expedição contava com um perito na manufatura do açúcar, bem como portugueses, italianos e flamengos com experiência na produção desse bem.⁴ Retornou a Portugal em 1534 e recebeu de Dom João III a Capitania de São Vicente (dividida em duas partes e atravessada por outra capitania), enquanto seu irmão recebeu a Capitania de Santo Amaro e de Itamaracá. Isso ocorreu devido ao rei julgar necessário a adoção do sistema de capitanias semelhante ao adotado na África. Isso acontecia devido ao pouco tesouro mantido pela coroa e introduzia capital privado na Colonização, fazendo aumentarem-se os domínios portugueses. Depois disso, viajou às terras que por direito eram suas e aqui morou por aproximadamente dois anos. Sua casa hoje é um museu naquela que foi a primeira vila da Nação Paulista. Após criar os meios necessários para a colonização da capitania, Martim Afonso partiu para as Índias Orientais, onde também fez um bom trabalho e que lhe proporcionou o título de Governador da Índia até o ano de 1546.⁸


Passou o fim da vida em Portugal colhendo os frutos de seus feitos durante a época das Conquistas. Sua esposa também teve papel importante nessas conquistas e por conseguinte, também usufruiu de seus méritos. Martim engrandeceu o nome de sua família e se tornou um homem admirado além-mar. Morreu em 21 de Julho de 1564 na capital do Reino. Sua efígie está esculpida no Monumento aos Descobrimentos, na margem direita do Rio Tejo, ao lado dos que como ele ajudaram a engrandecer Portugal. Em vida ele talvez jamais imaginaria que além de agigantar seu país, seria também um dos pioneiros duma nova nação, a nossa, a Nação Paulista. O fato é que Martim Afonso De Sousa, o Edificador, é uma das pessoas a quem devemos muito e que devem ser lembradas pelos Paulistas enquanto nosso povo exista.


Texto por Lucas Pupile
Revisão por Thales Veiga

Bibliografia:

¹ BOGACIOVAS, Marcelo Meira Amaral. Tribulações do povo de Israel na São Paulo Colonial, 2006 (Acesse aqui: http://migre.me/vdlhd

² SOUZA, Pero Lopes de. VARNHAGEN, Francisco Adolfo de. Diario da navegação da armada que foi á terra do Brasil em 1530 sob a Capitania-Mor de Martin Affonso de Sousa. Lisboa, 1839. (Acesse aqui: http://migre.me/w1bTi)

³ PELÚCIA, Alexandra Maria Pinheiro. Martim Afonso de Sousa e sua linhagem. Lisboa, 2007. (Acesse aqui: http://migre.me/w0ZOK)

⁴ FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo. Edusp, 2010.

⁵ Cf. carta de poder (II), Castro Verde, 20. XI.1530, pub. in Ibidem, vol. III, p. 160.

⁶ Cf. carta de poder (III), Castro Verde, 20.XI.1530, pub. in Ibidem, vol. III, p. 160. 

⁷ AQUINO, Rubim Santos Leão de. Sociedade brasileira: uma história através dos movimentos sociais. Record, 1999. 

⁸ Sousa, Washington Luís Pereira. Na Capitania de São Vicente. Brasília, 2004. (Acesse aqui:http://migre.me/w0ZPt)

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